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O ‘CORONAVÍRUS’. A VIDA DAS PESSOAS E A VIDA DAS EMPRESAS

Em tempos de pandemia não se pode perder tempo. É preciso ir direto ao ponto. O quadro posto sugere a distribuição do assunto em quatro tópicos distintos. A imposição do fato (ou da realidade). A função do ‘Estado’ em relação aos cidadãos. A vida das pessoas e a vida das empresas. As indispensáveis e urgentes medidas e quem cabe tomá-las.

O fato está posto. A Organização Mundial de Saúde (após as catástrofes na Ásia e na Europa) reconhece como ‘pandemia’ o denominado ‘Covid/19’. Trata-se de algo antes nunca visto, na medida em que o similar mais próximo data de um século atrás, quando sequer avião existia. É fato que não se discute. Trata-se, portanto, de uma realidade, um enfrentamento grave, uma questão de saúde que nesta dimensão deve ser tratada. Fazer leitura política deste fato é desprezar a vida.

O Estado, uma concessão do cidadão (animal social, inteligente, gregário, grupal) existe para, de modo racional, cuidar, exatamente, das pessoas. Todos os pensadores, cada um deles defendendo posições filosóficas próprias, reconhecem na figura do Estado (n’algumas situações confundindo-se com a figura da ‘sociedade’) uma forma coletiva de renúncia (por cada cidadão) de expressiva parcela de sua liberdade, exatamente para que uma ‘entidade’ geral, superior e organizada, possa (pudesse) cuidar de todos, tratando-os (tratando-nos) em condições de necessária igualdade (THOMAS HOBBES, ROUSSEAU, LOCKE, SPINOSA, dentre outros). Essa ‘instituição’, essa ‘entidade’ é o Estado. Aí está a sua natureza e o seu fundamento. A sociedade, como expressão das relações humanas, se moderniza todos os dias (desde sempre). O fenômeno da personalização da pessoa coletiva, notadamente na área das empresas comerciais (abreviando o discurso, aqui se adota empresa no sentido de sociedades empresariais, como pessoas, como sujeitos de Direito geradoras de empregos e recolhedoras de impostos) é considerada como uma das maiores criações do espírito humano. Sem as pessoas jurídicas (sem as empresas) a Humanidade ainda estaria abandonada n’alguma estação da Idade Média. Para não fugir ao tema, é preciso cingir-se à função do Estado como o ÚNICO agente responsável pelo bem estar dessas duas categorias de cidadãos: as pessoas naturais e as pessoas-empresas, que são os agentes motores da economia e de seus institutos: a criação de riquezas, a sua circulação e o consumo dos bens produzidos. Nessa dinâmica social, estão a saúde das pessoas e a paz que deve reinar na sociedade. Se o Estado não corresponder aos anseios de seus cidadãos (pessoas e empresas) deixará de cumprir a sua função. Não justificaria a sua existência. As pessoas e as empresas, reclusas, precisam, nesta hora, de recursos, de dinheiro para que suas vidas (e a vida do próprio Estado) possam caminhar. Ficará para outra oportunidade (sugere-se, para após o combate e a vitória sobre o inimigo comum: o vírus) a discussão sobre a origem dos recursos. A União (o Estado) não tem, agora, qualquer outra prioridade. É preciso priorizar a vida; é preciso justificar a existência humana e seus instrumentos como Humanidade e, portanto, é preciso dar sentido à figura do Estado. À parte qualquer discussão secundária sobre o império de regras que a imposição dos fatos obriga desconhecer (sugere-se a leitura do opúsculo de LON FULLER, ‘El Caso de Los Exploradores de Cabernas’) é preciso enfrentar a realidade e propor soluções. Necessário trazer a texto o exemplo da hora que é de compreensão de todos: – o vírus está solto, todos os cidadãos estão reclusos, pessoas estão morrendo, empresas estão fechadas, os hospitais estão desprovidos de ventiladores. Não dá para sustentar que os normativos menores da ‘CLT – Consolidação das Leis do Trabalho’ seriam intocáveis. Isto tem nome: é irracionalidade.

A forma de proteger a vida das pessoas (inclusive respeitando-se a quarentena que o vírus impõe [ele não conhece o discurso das leis]) está na indispensável presença do Estado, garantindo o funcionamento das empresas. A lição, em discurso de Estadista, veio na palavra do Presidente de Portugal, Professor Marcelo Rebelo de Sousa, ao dizer que para salvar vidas é preciso salvar as empresas. O único dever do Estado, nesta grave hora, é garantir a paz social, assegurando a todas as pessoas a certeza de que terão meios materiais de sobrevivência. Todos os recursos do Estado devem ser voltados para um único fim: salvar as pessoas (cidadãos) e salvar as empresas (também cidadãs).

Algumas medidas de ordem prática, no Brasil, ainda não foram tomadas. É preciso que assegurado seja o pagamento de todos aqueles que, tendo carteira assinada, precisam receber seus salários. Cabe ao Estado garantir esse pagamento, cujo resultado imediato estará na alimentação da economia (a começar pelo mercado de víveres); suspender o recolhimento de impostos e de exações, diferindo a sua cobrança para após o último combate com esse vírus-inimigo (sugere-se que os pagamentos dos impostos e taxas contingenciados sejam exigidos a partir do ano fiscal de 2.022). E não se há falar em perda de receita, porque não estando, as empresas, funcionando, também não estão auferindo receitas. Além dos recursos advindos de um desvio virtuoso de todas as verbas destinadas a quaisquer outras prioridades, que prioridades mais não são, sugere-se uma redução na folha de pagamentos, mediante desconto horizontal, de todos servidores públicos, com um corte em percentual para contribuir na viabilização de recursos (o Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, sugere desconto de 15 a 20%). No setor privado – de novo as empresas – sugere-se uma redução horizontal em todos os salários e remunerações, nesse mesmo percentual. O sacrifício há de ser de todos. Necessário, ainda, proporcionar, no âmbito das relações privadas, a revisão de todos os contratos com liberdade, principalmente no que diz respeito à relação laboral. A hipossuficiência do trabalhador, tão cara ao Direito do Trabalho, está mitigada. Enfraquecidos estão, também, os empregadores, exatamente os que pagam a conta.

Discursos jacobinos e girondinos agora não interessam. À falta de um Oswaldo Cruz, deve o Estado comportar-se com um mínimo ético (o que é também uma definição do Direito). Segundo o discurso geral, a pandemia fará muitos mortos. O que se espera, é que a inação do Estado não inclua dentre os que morrerão a ‘empresa’ brasileira e o seu sistema tão organizado e tão eficiente. A reforma das instituições fica para depois.

O Direito, noutra definição por sinal muito própria para a oportunidade, é ‘uma ordem da sociedade’, e é nesse sentido que a sociedade brasileira – cidadãos e empresas – espera que o Estado Brasileiro cumpra o seu dever.

José Anchieta da Silva – Vice-Presidente da Associação Comercial e Empresarial de Minas – ACMinas. Presidente da Academia Mineira de Letras Jurídicas.

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